sexta-feira, janeiro 25, 2013

O BRASIL DOS SEM PARTIDO


         
 Por Heródoto Barbeiro

                        A maioria esmagadora do povo brasileiro não tem nenhum partido político. Apenas quarenta por cento das pessoas declararam apoiar  alguma legenda. Não necessariamente como filiados, mas que votam nesta ou naquela por uma identificação qualquer. Por isso montar um partido não é um bicho de sete cabeças. Bastam umas quinhentas mil assinaturas. Com tanta gente sem nenhuma filiação, ninguém precisa abdicar de suas convicções para apoiar o nascimento de uma nova legenda. Os delegados estaduais e municipais pedem para os amigos, os amigos dos amigos, instalam uma banquinha na praça e em pouco tempo o número mínimo é alcançado. Por sua vez os delegados são recrutados entre possíveis candidatos às próximas eleições e estão a cata de legenda de votos.

                        Não se pergunta qual é o programa, a ideologia, a visão que o partido tem da sociedade brasileira. Depois de atendido o interesse imediato do participante, a questão seguinte é saber quem é ou quais são as estrelas do partido. Quem é o puxador de votos. Quanto o fundo partidário vai por de dinheiro público no novo partido. Quanto tempo de rádio e televisão vai poder usufruir. E por aí vai. Montam- as comissões provisórias nas cidades, geralmente com parentes ou amigos que apenas assinam a ata e só para constar e tudo está conforme a lei. Não é a toa que existem no Brasil mais de trinta partidos. Israel também tem,mas em outro contexto. A cúpula partidária passa a se encarregar de dar as diretrizes do partido e se forma uma oligarquia que se perpetua no poder. Não há disputa de grupos ou de correntes políticas. Há sempre uma composição que segue a máxima corporativa que o melhor é o ganha/ganha.

                        A minoria da sociedade brasileira declara que é filiada a um partido. A grande maioria desconhece até mesmo o que significa a sigla. Estatuto e programa poucos lêem. Pouquíssimas pessoas se dispõem a fazer um trabalho voluntário para angariar adeptos, convencidos que as soluções que o partido tem para os problemas da cidade, do estado ou do páis são boas ou podem ser melhoradas. Há um marasmo geral, seguido de uma letargia política e uma falta de interesse. Falta massa crítica de filiados e apoiadores. Os partidos não são lembrados nem nas eleições. O eleitor lembra do partido do fulano ou do ciclano, ou seja escolhe pela pessoa e não pelo partido. Salvo exceções, é claro. Isto faz os partidos terem uma participação pálida no processo democrático, quando deveria ser o contrário. É nesse batidão que alguns esperam a reforma política do Godot.

quarta-feira, janeiro 23, 2013

A Venezuela que a mídia esconde


Por Altamiro Borges

O Instituto Nacional de Estatísticas (INE) da Venezuela divulgou nesta semana que a pobreza extrema no país vizinho caiu de 11,36%, em 2001, para 6,97% no ano passado. Já os lares considerados “pobres” – a metodologia utilizada inclui superlotação, crianças fora das escolas, moradia precária e ausência de serviços básicos – caíram de 21,64% para 17,60%. Para Elías Eljuri, presidente do INE, a nova sondagem confirma os significativos avanços sociais nesta nação latino-americana.

“Por todas as vias examinadas, houve uma redução da pobreza bem importante. Já há estimativas de que a pobreza fechará em torno de 6,5% em 2012”, afirmou o pesquisador. Ele também forneceu detalhes sobre a pesquisa e disse que a aglomeração crítica de pessoas em casas se reduziu de 15,12% a 10,10%; a moradia inadequada de 9, 38% a 8,69% e lares sem serviços básicos de 14,69% a 8,68%. No último ano e meio, a “missão habitação” garantiu 346 mil novas residências e outros conjuntos estão para ser concluídos.

A mídia colonizada, que nestes dias baba com a posse de Barack Obama, evidentemente não vai destacar estas boas notícias. Sobre o país vizinho, os seus “calunistas” somente especulam – e alguns torcem – sobre a morte de Hugo Chávez. Para o desespero dos Mervais e Noblats, nesta semana pintaram notícias sobre a recuperação da saúde do líder bolivariano. A Reuters informou ontem que “ele deve voltar em breve à Venezuela”. Caso seja confirmado, alguns “calunistas” deveriam pedir demissão pelas suas besteiras!

segunda-feira, janeiro 07, 2013

O dilema da Reforma Agrária no Brasil do agronegócio


Por João Pedro Stedile
Da Coordenação Nacional do MST


A sociedade brasileira enfrenta no meio rural problemas de natureza distintos que precisam de soluções diferenciadas. Temos problemas graves e emergenciais que precisam de medidas urgentes. Há cerca de 150 mil famílias de trabalhadores sem-terra vivendo debaixo de lonas pretas, acampadas, lutando pelo direito que está na Constituição de ter terra para trabalhar. Para esse problema, o governo precisa fazer um verdadeiro mutirão entre os diversos organismos e assentar as famílias nas terras que existem, em abundância, em todo o País. Lembre-se de que o Brasil utiliza para a agricultura apenas 10% de sua área total.
Há no Nordeste mais de 200 mil hectares sendo preparados em projetos de irrigação, com milhões de recursos públicos, que o governo oferece apenas aos empresários do Sul para produzirem para exportação. Ora, a presidenta comprometeu-se durante o Fórum Social Mundial (FSM) de Porto alegre, em 25 de janeiro de 2012, que daria prioridade ao assentamento dos sem-terra nesses projetos. Só aí seria possível colocar mais de 100 mil famílias em 2 hectares irrigados por família.
Temos mais de 4 milhões de famílias pobres do campo que estão recebendo o Bolsa Família para não passar fome. Isso é necessário, mas é paliativo e deveria ser temporário. A única forma de tirá-las da pobreza é viabilizar trabalho na agricultura e adjacências, que um amplo programa de reforma agrária poderia resolver. Pois nem as cidades, nem o agro-negócio darão emprego de qualidade a essas pessoas.
Temos milhões de trabalhadores rurais, assalariados, expostos a todo tipo de exploração, desde trabalho semiescravo até exposição inadequada aos venenos que o patrão manda passar, que exige intervenção do governo para criar condições adequadas de trabalho, renda e vida. Garantindo inclusive a liberdade de organização sindical.
Há na sociedade brasileira uma estrutura de propriedade da terra, de produção e de renda no meio rural hegemonizada pelo modelo do agronegócio que está criando problemas estruturais gravíssimos para o futuro. Vejamos: 85% de todas as melhores terras do Brasil são utilizadas apenas para soja/ milho; pasto, e cana-de-açúcar. Apenas 10% dos proprietários rurais, os fazendeiros que possuem áreas acima de 500 hectares, controlam 85% de todo o valor da produção agropecuária, destinando-a, sem nenhum valor agregado, para a exportação. O agronegócio reprimarizou a economia brasileira. Somos produtores de matérias-primas, vendidas e apropriadas por apenas 50 empresas transnacionais que controlam os preços, a taxa de lucro e o mercado mundial. Se os fazendeiros tivessem consciência de classe, se dariam conta de que também são marionetes das empresas transnacionais,
A matriz produtiva imposta pelo modelo do agronegócio é socialmente injusta, pois ela desemprega cada vez mais pessoas a cada ano, substituindo-as pelas máquinas e venenos. Ela é economicamente inviável, pois depende da importação, anotem, todos os anos, de 23 milhões de toneladas  de fertilizantes químicos que vêm da China, Uzbequistão, Ucrânia etc. Está totalmente dependente do capital financeiro que precisa todo ano repassar: 120 bilhões de reais para que possa plantar. E subordinada aos grupos estrangeiros que controlam as sementes, os insumos agrícolas, os preços, o mercado e ficam com a maior parte do lucro da produção agrícola. Essa dependência gera distorções de todo tipo: em 2012 faltou milho no Nordeste e aos avicultores, mas a Cargill, que controla o mercado, exportou 2 milhões de toneladas de milho brasileiro para os Estados Unidos. E o governo deve ter lido nos jornais, como eu... Por outro lado, importamos feijão-preto da China, para manter nossos hábitos alimentares.
Esse modelo é insustentável para o meio ambiente, pois pratica a monocultura e destrói toda a biodiversidade existente na natureza, usando agrotóxicos de forma irresponsavel. E isso desequilibra o ecossistema, envenena o solo, as águas, a chuva e os alimentos. O resultado é que o Brasil responde por apenas 5% da produção agrícola mundial, mas consome 20% de todos os venenos do mundo. O Instituto Nacional do Câncer (Inca) revelou que a cada ano surgem 400 mil novos casos de câncer, a maior parte originária de alimentos contaminados pelos agrotóxicos. E 40% deles irão a óbito. Esse é o pedágio que o agronegócio das multinacionais está cobrando de todos os brasileiros! E atenção: o câncer pode atingir a qualquer pessoa, independentemente de seu cargo e conta bancária.
Uma política de reforma agrária não é apenas a simples distribuição de terras para os pobres. Isso pode ser feito de forma emergencial para resolver problemas sociais localizados. Embora nem por isso o governo se interesse. No atual estágio do capitalismo, reforma agrária é a construção de um novo modelo de produção na agricultura brasileira. Que comece pela necessária democratização da propriedade da terra e que reorganize a produção agrícola cm outros parâmetros. Em agosto de 2012, reunimos os 33 movimentos sociais que atuam no campo, desde a Contag, que é a mais antiga, MST, Via campesina ,até o movimento dos pescadores, quilombolas, etc., e construímos uma plataforma unitária de propostas de mudanças. É preciso que a agricultura seja reorganizada para produzir, em primeiro lugar, alimentos sadios para o mercado interno e para toda a população brasileira. E isso é necessário e possível, criando políticas públicas que garantam o estímulo a uma agricultura diversificada em cada bioma, produzindo com técnicas de agroecologia. E o governo precisa garantir a compra dessa produção por meio da Conab.
A Conab precisa ser transformada na grande empresa pública de abastecimento, que garante o mercado aos pequenos agricultores e entregue no mercado interno a preços controlados. Hoje já temos programas embrionários como o PAA (programa de compra antecipada) e a obrigatoriedade de 30% da merenda escolar ser comprada de agricultores locais. Mas isso está ao alcance agora de apenas 300 mil pequenos agricultores e está longe dos 4 milhões existentes.
O governo precisa colocar muito mais recursos em pesquisa agropecuária para alimentos e não apenas servir às multinacionais, como a Embrapa está fazendo, em que apenas 10% dos recursos de pesquisa são para alimentos da agricultura familiar. Criar um grande programa de investimento em tecnologias alternativas, de mecanização agrícola para pequenas unidades e de pequenas agroindústrias no Ministério de Ciência e Tecnologia.
Criar um grande programa de implantação de pequenas e médias agroindústrias na forma de cooperativas, para que os pequenos agricultores, em todas as comunidades e municípios do Brasil, possam ter suas agroindústrias, agregando valor e criando mercado aos produtos locais. O BNDES, em vez de seguir financiando as grandes empresas com projetos bilionários e concentradores de renda, deveria criar um grande programa de pequenas e médias agroindústrias para todos os municípios brasileiros.
Já apresentamos também ao governo propostas concretas para um programa efetivo de fomento à agroecologia e um programa nacional de reflorestamento das áreas degradadas, montanhas e beira de rios nas pequenas unidades de produção, sob controle das mulheres camponesas. Seria um programa barato e ajudaria a resolver os problemas das famílias e da sociedade brasileira para o reequilíbrio do meio ambiente.
Infelizmente, não há motivação no governo para tratar seriamente esses temas. Por um lado, estão cegos pelo sucesso burro das exportações do agronegócio, que não tem nada a ver com projeto de país, e, por outro lado, há um contingente de técnicos bajuladores que cercam os ministros, sem experiência da vida real, que apenas analisam sob o viés eleitoral ou se é caro ou barato... Ultimamente, inventaram até que seria muito caro assentar famílias, que é necessário primeiro resolver os problemas dos que já têm terra, e os sem-terra que esperem. Esperar o quê? O Bolsa Família, o trabalho doméstico, migrar para São Paulo?
Presidenta Dilma, como a senhora lê a CartaCapital, espero que leia este artigo, porque dificilmente algum puxa-saco que a cerca o colocaria no clipping do dia.

Fonte: Carta Capital