segunda-feira, junho 25, 2012

Versos da Canção óbvia – A Sombra Desta Mangueira


Escolhi a sombra desta árvore para

Repousar do muito que farei,
Enquanto esperarei por ti.

Quem espera na pura espera

Vive um tempo de espera vã.

Por isto, enquanto te espero

Trabalharei os campos e

conversarei com os homens

Suarei meu corpo, que o sol queimará,

Meus pés aprenderão os mistérios dos caminhos;

Meus ouvidos ouviram mais;

Meus olhos verão o que antes não viam,

enquanto esperarei por ti.

Não te esperarei na pura espera

Porque o meu tempo de espera é um

Tempo de quefazer.

Desconfiarei daqueles que virão dizer-me,:

Em voz baixa e precavidos:

É perigoso agir

É perigoso falar

É perigoso andar

É perigoso esperar da forma que esperas,

Porque esses recusam a alegria de tua chegada.

Desconfiarei também daqueles que virão dizer-me,

Com palavras fáceis, que já chegaste,

Porque esses, ao anunciar-te ingenuamente,

Antes te denunciam.

Estarei preparando tua chegada

como o jardineiro prepara o jardim

para a rosa que abrirá na Primavera.



PAULO FREIRE

segunda-feira, junho 18, 2012

De manta vermelha

Girava a chave no indicador para transferir o nervosismo às mãos, olhava para os lados com mais frequência que o normal. O gelo do nariz contrapunha o calor do peito, a ansiedade é umas das sensações que mais fazem o corpo falar e ela, como quem se vê nua no espelho, se percebia cantando em gestos involuntários. Esses instantes que precedem algo que pode vir a ser importante ou intenso, podem ser, por vezes, mais intensos que o evento em si. Eles nos mostram que naturalmente quase nada é natural na vida social, que a expectativa é umas das partes mais interessantes de se conhecer e viver algo. 
Aquela esquina já tinha se tornado um refúgio quando ele chegou a pé, e ao notarem a cor vermelha em comum da manta não foi necessário forçar nenhum sorriso de conveniência, os músculos da face não precisaram de ordem para se mexer. Duas quadras de caminhada, piadas ruins e convicções baratas, porém contundentes, já trocadas e ela, ainda refletindo a ansiedade, se atrapalha ao perguntá-lo o porque ele iria fazer isso por ela. Notou que poderia se assustar ou ainda não querer ouvir aquela resposta, entretanto, as vezes as bocas falam mais do que os neurotransmissores enviaram e a questão foi colocada. 
A demora dele para contestar criou um clima de suspense de inverno, quando as palavras foram saindo deu para notar que ele teria dificuldade de falar tendo que fazer, ao mesmo tempo, a complexa tarefa de atravessar ruas na faixa de segurança. Ela se divertiu com aquilo, em geral quando as pessoas demostram dificuldade de se expressar nos "papos emocionais" diante do foco da emoção, no caso ela, é porque estão no mínimo envolvidas.
Nesse caso era mais que isso, depois de responder por quase dez minutos sem dizer basicamente nada, ele deixou escapar: 
  - e também porque quero viver isso e outras coisas contigo.
Ela só sorriu por dentro porque o medo se misturava e naquele instante protagonizava suas feições. Quase chegando ele, torcedor fanático do Boca Juniors, respirou fundo e aquela foi a primeira vez dela no estádio Monumental de Núñes. Se beijaram demoradamente no meio da torcida no primeiro gol do River Plate.

quinta-feira, junho 14, 2012

Fácil né?

Temos a tendência de querer explicar tudo que envolve relacionamentos, e ainda temos uma mania, que é pior, de achar que entendemos do assunto. A verdade é que o tema é fecundo, cabe de achismos até análises de comportamento. Como os casos são infinitos e significativamente diferentes não há possibilidade de se entender todos os aspectos de um relacionamento, entretanto, creio (ingenuamente) que existem recorrências e sensações particulares que nos auxiliam pelo menos a nos aproximarmos de alguma compreensão dos nossos casos. 
E de antemão isso é importante, o melhor modo de você ajudar outras pessoas sobre isso é entendendo e decifrando as suas próprias relações e histórias. Porque aqui vale aquela máxima da educação infantil que os exemplos são mais eficientes do que teorias transmitidas. Falar de física quântica ou astronomia seria bem mais simples, mas já que começamos...

1- As relações são um jogo, fundamentalmente no início, dizer que não está jogando é uma jogada. Ser um jogo não quer dizer que seja algo leviano passível de trapaça, não confundamos as coisas. Falo aqui de um jogo de sedução, de descoberta, de inteligência, de adivinhação, de flexibilização do orgulho e autoconhecimento. Esse jogo pode se tornar algo horrível e as relações doentias e violentas estão ai para provar isso. 

2- Sempre chegará um momento que, claramente,  um vai querer mais que o outro;  é muito bom que isso ocorra quando a relação ainda está em estágio de estudo e não com compromisso selado, para se ter claro os prognósticos de possibilidades de uma relação futura saudável. Mesmo que as vezes as pessoas saibam que as chances de dar certo são pequenas, elas agridem a racionalidade e investem com tudo. Um dia você será caça e outro caçador e o modo como se reage a esses papéis deve ser diferente. 

3- Todo mundo mente e isso não é um problema, creio que o desafio da maturidade é não mentir sobre o que é fundamental pra ti na relação e nem sobre algo que possa fazer literalmente mal a saúde da outra pessoa. E isso não se refere ao universo da fidelidade ou ao moralismo das aparências, mas sim ao processo de construção do jogo, que trata do potencial das pessoas se fazerem melhores por se relacionarem. Falo do que Gárcia Máquez aponta na frase: "gosto de você não pelo que és, mas pelo que sou quando estou contigo".

4- Há saudades eternas, entenda e aceite. Fácil né? O tempo tende a preservar as coisas boas das grandes relações, logo a falta que as coisas boas fazem é forte e deve ser encarada como capítulo nobre que não seria escrito sem a relação.  Ver a saudade com orgulho é um modo de tirar o aspecto fúnebre que ela pode ganhar conforme for seu estado emocional. Saudade deve ter a mesma raiz etimológica de saúde, se não tiver eu to inventando. 

5- As pessoas interessadas uma nas outras não necessariamente querem se ver todos os dias ou todas as semanas. Os sujeitos são diferentes e, portanto, o modo de estar "a fim" é diferente pra cada um. Em muitas vezes o jeito de ser, de se comunicar ou de lidar com algumas situações é tido como sinônimo de desinteresse ou até indiferença pelo outro. Nem sempre, as vezes é mesmo o jeito das pessoas, então "não, porque nem sempre"! (Amarante)

Fiz essa incursão sobre relacionamentos porque não quis fazer música hoje, e termino com a sensação de ter dito um monte de coisa para não dizer nada, mas não confio muito em sensações. Até a próxima crise de Martha Medeiros. 

segunda-feira, junho 04, 2012

Porto dos casais


A vitrola vou levar
Porque ajudei a agulha gastar
Tentando te mostrar as músicas que mais
Diziam sobre nós

Ah gosto de tentar
Conhecer a rotina
Ter medo de ligar
Passar por inseguro,
Maduro seja lá..
O que quiser pensar
  
 Lembra da boba indiferença
De sair do carro balançando a cabeça
E voltar mais calma pra estender a mão
Que eu não ia pegar

Sei que é cedo pra dizer
Mas posso apostar
Que vamos escutar canções e passear
Como um velho casal
Começando a viver

Tanto faz se for o início ou o meio
Sempre há o lado bom mais intenso
Tanto faz se for o fim derradeiro
Se lembrar que se entregou de corpo inteiro