domingo, setembro 02, 2007

Enturmação

A reorganização das turmas das escolas estaduais, proposta pela secretária da educação do Rio Grande do Sul, Mariza Abreu, é um fenômeno material social instantâneo, que tem, no seu conteúdo, um referencial teórico evidente: o neoliberalismo que ganha braços nas políticas públicas de estado. Quero dizer com isso que, se esse fenômeno não for analisado, compreendido e enfrentado urgentemente, as medidas entrarão em prática de modo ainda mais drástico.

A enturmação, como está sendo chamada a mudança que pretende fazer o governo, pode ser pensada por dois aspectos fundamentais. O pedagógico-filosófico e o político-social-econômico, estes todos relacionados. A argumentação do governo, ao justificar essa medida no campo pedagógico, é a de que a interação hoje representa o alicerce da aprendizagem, e que a relação aluno-aluno é mais relevante que qualquer outra. A interação aí vista claramente de modo quantitativo, e as relações como processo que abrange toda e qualquer atividade, pois com 40 alunos em aula é impossível a organização de um núcleo mínimo de atividades orientadas.

O segundo aspecto é mais abrangente, pode ser entendido como uma empreitada estatal de corte de custos e de enfraquecimento da formação e da consciência de classe, não só da categoria do magistério, mas também das camadas populares que freqüentam e precisam da escola pública. O neoliberalismo como ideologia hegemônica, tenta fazer com que medidas como essas apareçam como únicas alternativas para os problemas postos, ou como resoluções naturais para melhorias necessárias. Para que isso aconteça, são necessários mecanismos de legitimação dessa ideologia, como a invisibilidade que os meios de comunicação promovem sobre a questão e o escasso debate no interior das comunidades e nas escolas. A alegação de que irão diminuir os gastos do Estado acomoda e convence a opinião pública.

A determinação de reorganizar o quadro das turmas visa utilizar melhor os recursos públicos da União e do Estado para a manutenção das escolas. Também estabelece um novo padrão de gestão de recursos humanos, com vistas à melhoria dos desempenhos de aprendizagem nas escolas gaúchas. (http://www.estado.rs.gov.br/index.php).

Esse trecho está no site oficial do Governo do Estado e mostra como é precária a argumentação teórica que essas medidas carregam.

Além da distorção da realidade feita no âmbito superestrutural, existe, nesse caso de que estamos tratando, uma questão prática do cotidiano de trabalho, há um tipo de terrorismo de gestão. Em todos os cantos do RS, ocorrem movimentos de desestabilização de qualquer grupo escolar de vanguarda. Escolas em que seus professores e funcionários resistem em adotar medidas autoritariamente impostas, onde são organizados politicamente, têm uma consolidada articulação de formação e desenvolvem uma consciência de classe, estas sofrem intervenções diretas, com transferência de professores de escolas e de área, trocas de horários e professores/as contratados são lembrados quase que, pessoalmente, da sua condição de trabalho, entre outras ações e ameaças.

Esse é um dos meios usados, o que estamos discutindo nesse texto, mas a gestão pública do governo do estado promove, linearmente, a política neoliberal de estado mínimo e de sucateamento dos bens públicos em todas as esferas da estrutura estatal. Podemos citar, literalmente, onde isso está ocorrendo, para não parecer que estamos fazendo um discurso vazio: aproximadamente 10% dos servidores da área administrativa da Emater (226 trabalhadores) serão demitidos, confirmou o governo do estado. A Procergs está em processo de desmanche, equipamentos estão sendo desinstalados e o trabalho está cada vez mais escasso, com isso a iniciativa privada vai ocupando seu espaço. O governo está parcelando o salário do funcionalismo há meses. A UERGS deixou de fazer vestibular em várias unidades. Eis alguns exemplos do que vem ocorrendo no estado do Rio Grande do Sul!

Essas ações de gestão pública, sabemos que estão imersas em um estado burguês que se caracteriza pela luta de classes e pela orientação da lógica do capital, porém ao governar, pode-se, ainda que com muitas dificuldades, fazer-se uma opção. Ou se fortalece a hegemonia neoliberal de valores capitalistas e de livre mercado, ou se vai de encontro a essa orientação. Nosso país e estado são pratos fartos para iniciativa privada seguir seu caminho de lucros cada vez maiores, enquanto o trabalhador e a massa pobre brasileira enfrentam fortes ‘cortes de despesas’.

Gregório Grisa

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