terça-feira, janeiro 26, 2010

Acolá

Longe..

A imagem é o horizonte
o texto é importante
as lembranças são bastante
e a voz é tão distante

Perto..

O que vejo é concreto
a conversa é o remédio
o viver é natural
quando é no meu quintal

Longe é mais fácil de notar
que perto é o melhor lugar

A6 - E7+ (2X)
F#m - B - A
R: E - D - A

segunda-feira, janeiro 18, 2010

Haiti – Muito além do horror

A dor do povo haitiano e inimaginável e imensurável.

Sobre a dramática situação do Haiti, é desumano ficar refém da cobertura das grandes redes de tv brasileiras. Primeiro, porque o relato falado pelos enviados não bate com as imagens geradas pela mídia internacional. Já no primeiro dia, ficaram batendo na tecla que o governo haitiano era incompetente em gerar estatísticas, número de mortos, os números se reiificam e são mais importantes que a dor.

Certamente, o Haiti não tem governo, tem uma tutela do imperialismo via ONU e, se tivesse, será que produzir estatísticas era o fundamental naquele momento? Desesperados, âncoras do jornalismo brasileiro tentam arrancar, literalmente, dos enviados, via telefone, informações sobre a violência e a insegurança instaladas, enquanto as imagens reproduzidas mostravam a população chorando, vagando, cantando seu canto de tristeza, as pessoas não praticavam nenhuma violência, elas eram as próprias vítimas da violência. No telejornal, desesperada, a âncora da rede Globo não queria saber sobre o sofrimento daquele povo e enfatizava que existiam relatos de saques e roubos a supermercados, quando, outra vez, as imagens mostravam os destroços de supermercados, os adultos removendo os escombros, numa operação arriscada, para ter acesso à água e alimentos para crianças e mulheres grávidas. Para a jornalista, seria melhor que os alimentos apodrecessem sem que a população pudesse ter esse acesso num momento de desespero?

Nos dois primeiros dias, só se via a população negra perambulando pelas ruas e não se viam os soldados das Forças de Paz, pois foi omitido que estas, inclusive a brasileira, estavam vigiando os bancos e as mansões dos magnatas brancos haitianos e estrangeiros, para evitar “violência dos negros bárbaros”. Só faltou dar-lhes, literalmente, este conceito. Esta não é uma manipulação da mídia brasileira, excepcionalmente, ela só reflete uma prática cotidiana, de como a população brasileira recebe o viés das notícias. Outra cena que dá para envergonhar os brasileiros, é o ridículo e patético Ministro da Defesa (dos ricos) Nelson Jobim fardado, fazer uma visita de menos de 24 horas ao Haiti, aliás, ficou mais tempo dentro do avião, que em solo haitiano, foi fazer o quê?

O Brasil é uma força de ocupação a mando dos Estados Unidos, sua função não é garantir a paz ou reerguer o país, mas sim, garantir a exploração e subjugação do povo haitiano. É necessária a ajuda humanitária, mas isso não se faz com soldados que são treinados para a guerra. São necessários médicos, enfermeiros, agentes sociais, como os que mandou Cuba.

É preciso deixar que os haitianos sejam donos de seu próprio destino, é necessária a saída das tropas de ocupação do Haiti. Não se escuta nos noticiários que boa parte dos bancos de sangue dos EUA são de sangue de jovens haitianos trocados por centavos de dólar, esta é uma exploração garantida pelas tropas brasileiras subservientes ao Pentágono, e este, para seguir garantindo a mão de obra barata, manda 10.000 soldados para garantir a “ordem” capitalista e sua exploração direta. Há muito cinismo nesta “dor” da mídia brasileira.

José Ernesto Alves Grisa

Mestre em Sociologia UFRGS - IFF

domingo, janeiro 17, 2010

Para que serve a literatura

Conta-se que no final da Segunda Guerra Mundial, quando chegaram num campo de concentração que contava com inúmeros prisioneiros inocentes, os soldados de uma das divisões das tropas aliadas surpreenderam alguns dos seus inimigos nazistas sentados e calmamente lendo uma das obras mais importantes e humanistas da literatura universal: nada menos do que Fausto, de Goethe.

A leitura daquele livro não tornava seus leitores menos culpados pelo horror que estava sendo cometido por eles próprios. Também não impedia que cada um daqueles soldados literatos cumprissem com suas atribuições de prender, torturar e matar seus semelhantes como nenhum outro animal além do humano é capaz de fazer.

Nada mais desconfortante para os defensores da literatura como forma de humanização do que a idéia de que o homem pode combinar a satisfação estética sentida após a leitura de uma peça de Shakespeare com uma prática anti-humana, perversa e cruel.

Apesar disso, como nos ensina o crítico literário Antônio Cândido, a literatura contribui para que se confirmem em cada um de nós “…aqueles traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor”.

A literatura serve, por certo, para dar prazer e satisfação para todos, mas só os bons levam a sério suas mensagens humanistas: os demais permanecem indiferentes. Bons livros não convencem uma pessoa má a melhorar. Pode-se supor que alguém que tenha sido pago para assassinar, na sua infância tenha sido um leitor entusiasmado de Monteiro Lobato.

As mensagens humanistas dos livros só atingem as pessoas predispostas para a sua recepção. É provável que os romancistas estejam condenados a “pregar aos convertidos”, a convencer aos convencidos, como tinha o costume de escrever o sociólogo Pierre Bourdieu.

Mesmo assim, um pioneiro investigador dos segredos humanos como Freud não dispensava os conhecimentos propiciados pela literatura. Para o fundador da psicanálise “…os poetas e romancistas são aliados preciosos, e seu testemunho deve ser tido em alta estima pois eles conhecem, entre o céu e a terra, muitas coisas com as quais nossa sabedoria escolar não poderia sequer sonhar. Eles são para nós, que não passamos de homens vulgares, mestres no conhecimento da alma, pois se banham em fontes que ainda não se tornaram acessíveis à ciência.”

Com tudo isso, não deixo de pensar que após a leitura de um livro como Levantado do Chão, de Saramago, que descreve o sofrimento e a luta dos trabalhadores rurais portugueses, nenhum dirigente do Fundo Monetário Internacional deixará de impor aos países devedores as medidas econômicas que levam a fome e o sofrimento para milhões de pessoas em todo o mundo.

Talvez a literatura sirva mesmo é para convencer os convencidos a permanecerem contra todas as formas de opressão do humano. Se servem para tanto, isso já é um grande bem, pois, embora aqueles que não praticam o bem continuem difundindo o mal, não conseguirão jamais impor a idéia de que ser humano é ser apenas como são.

Walter Praxedes - Doutor em Educação pela USP e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá.

sábado, janeiro 02, 2010

Alguns números do último Censo Agropecuário do IBGE

A cada 10 anos o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – faz um levantamento, uma pesquisa, indo de casa em casa, para saber como está a vida e a produção no meio rural brasileiro.

O último Censo Agropecuário foi feito em 2006 e publicado em 2009. Esta pesquisa permite fazer um retrato, uma fotografia de como está a vida e a produção na roça e dá para fazer algumas comparações importantes sobre as diferenças entres os grandes e pequenos agricultores, entre o agronegócio e a agricultura camponesa.

Vamos ver alguns números desta pesquisa:

Propriedade e posse da terra

Os pequenos agricultores têm 24% de todas as terras privadas do Brasil.

Quer dizer, de cada 100 hectares de terras, 24 são de camponêses.

Os médios e grandes tem 76% de todas as terras particulares.

De cada 100 hectares, 76 é do agronegócio.


Número de estabelecimentos rurais, propriedades, posses, lotes

Os camponeses possuem mais de 4 milhões e 360 mil estabelecimentos rurais.

Os médios e grandes proprietários somam apenas 807 mil estabelecimentos rurais.

Os grandes proprietários (acima de mil hectares) têm apenas 46 mil imóveis rurais. E os latifundiários (acima de 2 mil ha), são apenas 15 mil fazendeiros, que detém 98 milhões de hectares.

O que produzem

Os camponeses produzem 40% da produção agropecuária do Brasil (medida pelo Valor Bruto da Produção Agropecuária Total), apesar de terem apenas 24% das terras, e ainda, nas piores condições de topografia e fertilidade. Além disso, sabe-se que grande parte da produção do camponês é para auto-sustento, portanto não é vendida.

Os médios e grandes proprietários extraem 60% da produção agropecuária do país, tendo 76% de todas as terras do país, entre elas as mais planas e férteis e melhor localizadas para o mercado.

Valor da produção por hectare

1 hectare da agricultura camponesa fatura, em média, uma renda de R$ 677,00.

1 hectare do agronegócio fatura, em média, uma renda de apenas R$ 368,00.

Quem produz o que o povo brasileiro come

Daquilo que vai para a mesa dos brasileiros, 70% é produzido pelos pequenos agricultores, pelos camponeses.

Só 30% do que vai ao prato dos brasileiros vem das grandes propriedades, que priorizam apenas as exportações, ou seja, não produzem comida, querem produzir apenas "commodities"!


Trabalho para o povo

As pequenas propriedades, dão trabalho para 74% de toda mão-de-obra no campo brasileiro.

As médias e grandes propriedades, o agronegócio, mesmo com muito mais terra, só dão emprego para 26% das pessoas que trabalham no campo. Preferem utilizar mecanização intensiva e muito agrotóxico.

Por isso, o Brasil se transformou, na safra de 2008/2009, no maior consumidor mundial de veneno agrícola. São aplicados 700 milhões de litros de veneno por ano em nosso país.

Quantas pessoas trabalham por hectare

Na agricultura camponesa, em cada 100 hectares, trabalham 15 pessoas.

No agronegócio, em cada 100 hectares, dão emprego para apenas 2 pessoas.

Os recursos do Crédito Agrícola

Os valores do crédito não estão no Censo Agropecuário, mas no Plano Safra. Assim, no Plano Safra 2009/2010 foram destinados R$ 93 bilhões para o agronegócio. E apenas 15 bilhões de reais para a agricultura camponesa. Mesmo assim, sabe-se que apesar da crescente oferta de recursos para a agricultura camponesa, apenas 1,2 milhões de estabelecimentos familiares tem acesso ao crédito, e na ultima safra utilizaram apenas 80% do que esta disponível.

Isto significa que os camponeses utilizam apenas 14% do crédito agrícola do total ofertado pelos bancos, atraves das normas e determinações da política agrícola do governo federal.

Texto do Frei Sérgio Görgen, membro do MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores) e da Via Campesina/Brasil.