domingo, dezembro 28, 2014

Como guiamos nossa inquietude

Somos seres inquietos, um dos grandes desafios que temos é dar uma conotação racional e positiva para essa inquietude. Rechear nossa inquietude de objetivos interessantes, de metas cooperativamente pensadas. 

O tema do bem viver tem sido pauta da filosofia contemporânea e passa sem dúvida por desenvolvermos essa capacidade de filtrar nossas inquietudes. 

A tranquilidade de aproveitar as vivências simples, do dia a dia, de usufruir de momentos menos exuberantes e mais intimistas tem encontrado forte concorrência com a necessidade de ostentação e consumo desenfreado que vivemos.

Se nossas inquietudes se pautarem por posturas desse segundo movimento, estaremos perdendo grande oportunidade de "ser mais" no sentido atribuído por Paulo Freire (pesquise caso nunca tenha lido). A inquietude humana é natural, o tom que atribuímos a ela é uma escolha cultural.

Viver bem, e cada vez mais isso se confirma, não tem relação direta com acumular bens materiais ou repetir experiências de prazer efêmeras "ad eternun". Tem a ver com diversificar, com colaborar, com se encantar, seja no trabalho ou na vida particular.

Vive bem quem consegue identificar os limites culturais do seu tempo, sem considerar tais limites insuperáveis. 

Vive bem quem participa da elaboração de causas coletivas, mesmo que seja em área específica. 

Vive bem aquele que desmorona de vez em quando, que se desilude, mas que se orgulha dos caminhos trilhados.

O sucesso alcançado por quem tem posturas cuja ganância, bajulação de superiores e frágeis princípios são as características é o resultado que queremos, é viver bem? Precisamos questionar uma sociedade que premia essas condutas, caso da nossa.

Fazer esse questionamento de modo inquieto é um papel importante a ser cumprido. Direcionar a nossa inquietude para desenvolver outra forma de viver é uma arte infinita. 



quarta-feira, dezembro 17, 2014

Postamos nossas incompletudes



A internet tem mudado a velocidade com que acessamos informação e emitimos opiniões de forma histórica e, pelo visto, sem volta. Outro dia ouvi que as postagens que faço são estranhas, entediosas e até certo ponto "pesadas" acho que no sentido de "densas".

Em conversa com professores em uma escola pública recentemente falei que ainda não temos clara noção do que significa nossas postagens nas redes sociais, elas podem ter uma relevância significativa ou não fazer diferença nenhuma, descobriremos isso em um futuro próximo.

Até lá decidi priorizar postagens que tenham relação com a vida pública, com a política, com a ciência, a economia. Essa escolha deixa de lado postagens de caráter mais pessoal, íntimo, ela não foi tomada de forma plenamente racionalizada, mas aconteceu assim. Não sou crítico de quem usa as redes apenas para temas privados, não vejo problema com isso, tenho receios sobre questões de privacidade, principalmente envolvendo criança, mas se tratado com bom senso é uma postura saudável.

Por outro lado, penso que tais ferramentas podem nos oferecer muito mais, podem nos oportunizar conteúdo que nos levem para além de nossa rotina particular, do nosso trabalho por vezes repetitivo e pouco inspirador.

Quando postamos algum texto, compartilhamos alguma reflexão, pesquisa, análise, pintura, documentário, estamos tentando fazer com que mais pessoas tenham acesso a algo que achamos interessante. Nem todo texto compartilhado representa exatamente o que pensamos, mas se ele provoca alguma reflexão, pondera uma crítica diferente ele merece ser lido. Acho positivo quando se experimenta algumas transições de conteúdo, é importante não reproduzir apenas as mesmas fontes e perspectivas. 

Utilizamos a fim de formação pessoal e profissional a internet, mas de modo ainda modesto, as possibilidades são incríveis, todavia nos circunscrevemos em visitar perfis, cuidar o que estão fazendo algumas pessoas, nos auto promover (em alguns casos criando uma vida fictícia nas redes, o que já vem acarretando graves problemas psicológicos e depressão), ou até nos auto depreciar.

Uma das maneiras mais interessantes de conhecer uma pessoa hoje em dia é analisar suas postagens, saber o que ela deseja que os outros leiam, vejam e acessem. Com a ansiedade em opinar ou compartilhar visões sobre temas polêmicos e importantes, rapidamente deixamos nossa marca, damos nossos pitacos. Vejo isso de modo positivo, nós postamos nossas incompletudes, nossos limites, porém, esse não é um motivo para não participar, não postar, vejo essa dinâmica como uma oportunidade para acurarmos nossas perspectivas, melhorarmos nosso entendimento através do diálogo que pode se estabelecer com visões distintas.

As redes sociais matam saudades, reforçam amizades, mas também ampliam os horizontes de quem sabe usá-las de modo mais plural e menos íntimo. Por mais enfadonhas que sejam as postagens, caso uma entre centenas de pessoas se sentir provocada ou sensibilizada, me sentirei satisfeito. 

Gregório Grisa


quinta-feira, dezembro 04, 2014

Educar para a ética e a cidadania



Por Márcia Tiburi,

A desvalorização da esfera pública parece ser um fato cultural generalizado. Mas a cultura é também formação. Isso quer dizer que ela se cria também pela educação. Creio que o descaso com a formação, no sentido mesmo de educação, leva ao abandono da esfera pública. É a nossa formação que nos ensina a valorizar alguma coisa.

Vivemos sob uma espécie de nuvem pesada em nome da qual algo como a própria ideia de “sociedade” não vale a pena. Então, as pessoas se voltam para si mesmas. Surge uma moral individualista, em que os interesses privados são sempre maiores do que os públicos.

Tudo o que é pessoal parece ser antissocial. A aniquilação da esfera pública significa, neste caso, fim do “político”. A questão seria tentar reconectar esses territórios, o pessoal e o político, a esfera privada e a pública, mostrando como são interdependentes.

E a grande pergunta é sempre a pergunta pelo “como”. Mas “como”? Aquilo que está possivelmente sendo feito nas escolas provavelmente seja nada, salvo alguma alternativa pontual que não vem a público. Quer dizer, não sabemos o que fazer e não imaginamos que alguém esteja fazendo algo.

Então, o que precisaria ser feito: campanhas de conscientização, debates, textos de divulgação do tema, projetos pedagógicos e culturais em torno da ética. É provável que o tema da ética seja assunto apenas dos professores de Filosofia, mesmo assim é provável que seja tratado em poucas aulas e na forma de um conteúdo a ser transmitido.

A ética não é um conteúdo, ela é uma reflexão e uma prática de reflexão que leva a outras ações. Mais precisamente uma filosofia prática. Como ensinar filosofia prática? Ensinando a pensar. Como ensinar a pensar? Conversando, propondo desafios teóricos e práticos, que envolvam pesquisa e ação, investigação e arte.

Há coisas muito práticas a fazer: praticar a sinceridade, a autorreflexão, a autoformação. A sinceridade deve ser uma prática ética. As coisas, por mais dolorosas que possam ser, por mais comprometedoras, devem ser ditas. Certamente, a principal mediação a esse gesto deve ser o respeito.

O problema é que vivemos numa cultura em que o descaso consigo mesmo e com o outro é a regra, e o respeito a si e ao outro não encontra sentido. O problema é que as pessoas esquecem ou nunca conheceram essas potencialidades. Refiro-me ao autoconhecimento. Talvez isso deva novamente ser colocado em cena.