quarta-feira, setembro 30, 2009

Balanço

Eu olhando assim, o teu jeito novo de andar
sem medo, parece dançar
Cada passo tem muita areia viva a pular
e o vento ajuda a voar

Que bom o verão (pra)
brincar sem o tempo contar (pra)
te ver crescer em um bom lugar (pra)
lembrar da pracinha e do mar

Olha lá quem vem, corre firme ela vai te abraçar
e os beijos não vão faltar
conta do nosso dia, limpa o rosto e lava tua barriga
a lua já vai chegar...

E - Bm - A - F#m5-/7 - C
(A - E) ...F# - A - B

terça-feira, setembro 29, 2009

Funeral de um lavrador




Esta cova em que estás com palmos medida
É a conta menor que tiraste em vida
É de bom tamanho, nem largo nem fundo
É a parte que te cabe deste latifúndio
Não é cova grande, é cova medida
É a terra que querias ver dividida

João Cabral de Melo Neto







O jornal Zero Hora do dia 22 de agosto de 2009 noticiou a execução pelo Estado do camponês sem terra Elton Brum da Silva, em São Gabriel (RS), com uma reportagem intitulada “MST ganha seu mártir”. O curto, impactante e decisivo título da matéria induz – ou busca induzir – o leitor a entender que o episódio não só teve saldo positivo para o movimento dos sem-terra como por ele foi planejado e provocado.

Subentende-se, portanto, pelo discurso contido em Zero Hora, que, se houve erro da polícia, este não foi ter matado um ser humano, mas ter presenteado o MST com um mártir. Como se de mártires os que lutam pela reforma agrária ainda precisassem – vide o massacre em Eldorado dos Carajás e tantas outras ações da polícia e de capangas em defesa do sagrado e inalienável direito dos latifundiários à propriedade.

Após trazer, em nome da protocolar imparcialidade, a informação de que testemunhas atribuíram a autoria do disparo a um oficial da Brigada Militar, o texto prontamente trata de desqualificá-la: “Grande parte das testemunhas é ligada ao MST, que já deu início a uma primeira estratégia de reação: orientou seus militantes a soterrarem com depoimentos os cartórios da Delegacia da Polícia Civil de São Gabriel, que investigará a morte. Os testemunhos repetem que o autor do disparo é da BM”. A reportagem não teve curiosidade de apurar se, por acaso, os policiais que participaram da operação foram orientados por seus superiores sobre a versão que deveriam sustentar para livrar a cara de comandados e, principalmente, comandantes sobre a responsabilidade pela ação criminosa?

No decorrer da notícia, Zero Hora continua martelando a ideia de que o MST só tem motivos para festejar o ocorrido e aproveitá-lo politicamente: “O segundo passo dos militantes poderá ser uma grande movimentação em direção à fronteira, ainda sem data definida.”

Nenhuma linha sobre a dor de familiares e companheiros da vítima, como é tão comum em notícias cuja personagem violentamente assassinada provém da chamada classe média. Aliás, não lembro alguma vez ter visto Zero Hora ou qualquer outro veículo da grande imprensa decretar, quando do homicídio de um membro da tal classe média, que os setores conservadores da sociedade ganharam um mártir em sua sanha por pena de morte, redução da maioria penal ou tolerância zero nas operações policiais em favelas e guetos. Em suma, para que o Estado legitime, cada vez mais, a sobreposição do direito à propriedade em detrimento do direito à vida.

O crime

O militante sem-terra Elton Brum da Silva, 44 anos, tombou varado nas costas por um tiro de espingarda calibre 12. O crime ocorreu durante operação da Brigada Militar para cumprir ordem de reintegração de posse concedida pela Justiça ao fazendeiro Alfredo Southall, cujo latifúndio soma mais de 13 mil hectares.

Nenhuma arma de fogo foi encontrada pela polícia em posse dos sem-terra que ocupavam a fazenda. O próprio governo do Rio Grande do Sul admite que o tiro partiu da Brigada Militar.

Ao que tudo indica, o autor do disparo ostenta uma alta divisa no braço que puxou o gatilho. Em entrevista divulgada pela Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), o ex-ouvidor agrário do governo do RS Adão Paiani disse ter ouvido de fontes policiais que o tiro à queima roupa contra Elton Brum da Silva foi disparado por um alto oficial da brigada. "Se essa conta for debitada a um soldado da Brigada, eu, como filho de um soldado da Brigada, vou apontar o nome do autor do homicídio", afirmou Adão Paiani.

O jornal classifica reiteradamente a ação como “desastrada”, e não como resultado de uma visão política e governamental de criminalização dos movimentos. No entanto, as fotos e relatos da operação de remoção do acampamento de trabalhadores sem-terra - humilhação e violência contra os manifestantes -, e o histórico de repressão por parte do atual governo do RS a manifestações como as de estudantes e sindicalistas prova que o tiro fatal contra o militante é antes uma consequência que um desvio do pensamento do poder Executivo gaúcho.

Sem argumentos para justificar a ação, a saída é desqualificar seu alvo: “Os sem-terra invadiram a Southall no dia 12 e, como de costume, protelaram sua retirada da fazenda. Contrariaram a ordem judicial para que evacuassem a área. Esticaram até o ponto de ruptura a tênue linha que separa a legalidade da clandestinidade e da desobediência metódica.” No discurso do jornal, manter latifúndios improdutivos está abrigado sob a legalidade, embora não seja isso que reze a Constituição Federal, e lutar por reforma agrária e por acesso à terra, direitos previstos pela mesma Constituição, é clandestina desobediência.




Foto: César Soares/extraída do Portal Terra

Fonte: http://portadordeausencias.blogspot.com/

segunda-feira, setembro 28, 2009

Pontos importantes foram retirados do Estatuto

Cotas raciais nas universidades e garantia de terra aos remanescentes quilombolas não são previstas no texto aprovado pela Câmara.

Michelle Amaral,

da Redação

Após quase de 10 anos de discussões em torno do Estatuto da Igualdade Racial, o texto aprovado pela Câmara dos Deputados deixou de contemplar alguns pontos previstos no texto original da proposta, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS).

Para ser aprovado, foram retirados do texto do Estatuto a garantia das cotas raciais nas universidades públicas, contestada pelo Partido Democratas (DEM), e a regularização de terras para remanescentes de quilombos, criticada pela bancada ruralista.

Questão fundiária

O argumento utilizado pelos parlamentares para a retirada do artigo que garantia a regularização das terras aos remanescentes de quilombos é a de que a questão já é prevista no decreto n.º 4.887 de 2003, que regulamenta o artigo 68 da Constituição Federal, que trata da demarcação de terras quilombolas.

Para Douglas Belchior, membro do conselho geral da União de Núcleos de Negros e Classe Trabalhadora (Uneafro), ao não reafirmar esse direito aos quilombolas no Estatuto, “o Estado brasileiro avança menos em relação à igualdade racial”. Ele afirma que a argumentação dos parlamentares é vazia, porque este é um direito descrito na Constituição, mas que ainda hoje não é uma realidade. "O Brasil teoricamente é um país democrático, de igualdade de direitos, mas essa igualdade não tem sido cumprida", completa.

“Toda vez que o debate da estrutura fundiária é colocado, há o levante dos setores reacionários”, observa Marcelo Paixão, diretor de graduação do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro do Movimento Negro do Rio.

Marcelo Paixão recorda uma declaração do deputado Indio da Costa (DEM-RJ), logo após a aprovação do Estatuto, de que se fosse prevista em seu texto a regularização das terras quilombolas haveria o risco de se formar “uma espécie de MST negro”. O professor defende que há um potencial de luta muito grande por parte das comunidades quilombolas, sendo que muitas já foram reconhecidas pela Fundação Palmares. Nesse sentido, Paixão diz querer muito “que as palavras do deputado se realizem, porque um MST negro aliado ao que já existe resultaria em muitas conquistas”.

Cotas nas universidades

Marcelo Paixão pondera que a obrigatoriedade da reserva de cotas raciais nas universidades públicas é uma questão polêmica, porque “a universidade brasileira é conservadora”. Ele acredita que a política de cotas é uma medida importante, mas que por si só não resolve este problema.

“Não acredito que a universidade brasileira mude positivamente se não mudar seu corpo discente e docente”, opina. Para Paixão, “se a política de cotas for adotada será um favor não só para a população, mas para a universidade, porque vai diversificar seu corpo discente e até docente, vai enriquecer a universidade”.

Desde 2008 tramita no Senado um Projeto de Lei Complementar que reserva 50% das vagas nas universidades para quem cursou o ensino médio integralmente em escola pública, sendo metade dessa cota para estudantes negros, pardos e indígenas e a outra metade para alunos oriundos de famílias com renda de até um salário mínimo e meio per capita. No entanto, o PLC 180 encontra dificuldades em ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) devido a posicionamentos contrários à adoção de políticas de cotas raciais.

Douglas Belchior analisa que neste contexto seria muito importante constar no Estatuto a garantia das cotas e a exclusão desse ponto “reafirma que a luta em torno das políticas de cotas deve continuar”.

domingo, setembro 27, 2009

OS ESCRITOS SECRETOS ACHADOS NO LIXO DE ZERO HORA

No dia em que o tablóide gaúcho Zero Hora chegava às bancas com uma espetacular matéria acerca de um "novo caderno dos sem-terra", com anotações secretas que revelariam as "estratégias" do MST, a Unidade Roto Rooter de Reportagem deste Cloaca News passava pela rua lateral à sede daquele diário - curiosamente, Rua Zero Hora - quando teve sua atenção chamada por um enorme latão, cheio de embalagens gordurosas de pizza e papéis picados. Estacionamos nosso Cloacomóvel diante do recipiente e, burlando o aparato de segurança daquela organização, recolhemos a esmo o que foi possível. De volta à nossa redação, pudemos, enfim, avaliar todo o papelório. Entre o material recolhido estava um caderno escolar, de capa alaranjada, com 26 páginas escritas à mão, contendo anotações do que parece ser o resultado de uma reunião de pauta daquela gazeta, ocorrida dias antes.
Sob o título "Linhas Gerais", podemos presumir que tratam-se de diretrizes editoriais que valem "p/ ZH, DSM e Pioneiro", ou seja, Zero Hora, Diário de Santa Maria e O Pioneiro, de Caxias do Sul, os três principais veículos impressos do Grupo RBS no Rio Grande do Sul.
Alguns nomes estão grafados por iniciais, como YRC, por exemplo. Coincidentemente, as três letrinhas formam as iniciais da tucana Yeda Rorato Crusius. Há também referência a um certo "P.S.", em que se cobra dele uma "carta bimestral". Verificando o histórico epistolar do colunista Paulo Santana, que vira e mexe troca correspondência com YRC, imaginamos ser este o personagem da anotação.





Nesta outra imagem (abaixo), sugere-se que "LM" repercuta "RO" e "vice-versa". O tópico trata de uma eventual "sinergia" entre os vários veículos do grupo. "LM" seria Lasier Martins, da Rádio Gaúcha e do Jornal do Almoço, na RBS TV. "RO", ao que tudo indica, é a colunista joão-ninguém de ZH, Rosane de Oliveira.
Outra sigla é "TG", supostamente, o Ministro da Justiça e pré-candidato ao governo estadual Tarso Genro. Pelas instruções editoriais, deve ser atribuída a ele toda a responsabilidade por qualquer "vazamento". Não nos parece, nesse caso, que estejam tratando de problemas hidráulicos.
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Bastante elucidativa, igualmente, a página dedicada à cobertura do MST.
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Tanto quanto o caderno "jogado em uma lata de lixo no estacionamento do Incra", apresentado por Zero Hora, que "permite que a sociedade conheça o que o movimento [MST] pensa sobre assuntos estratégicos", este odorante achado do Cloaca News permite que a sociedade conheça o tipo de jornalismo praticado pela corporação hegemônica, sob o báculo da famiglia Sirotsky, com a cumplicidade de sua devotada matilha.

Fonte: http://cloacanews.blogspot.com/

sábado, setembro 26, 2009

Cotas: uma nova consciência acadêmica

JOSÉ JORGE DE CARVALHO

A África do Sul, ainda nos dias do apartheid, já tinha mais professores universitários negros do que nós temos hoje


ENQUANTO cresce o número de universidades que aprovam autonomamente as cotas, a reação a esse movimento de dimensão nacional pela inclusão de negros e indígenas vai se tornando cada vez mais ideológica, exasperada e descolada da realidade concreta do ensino superior brasileiro.
Em um artigo recente ("O dom de iludir", "Tendências/Debates", 9/9), Demétrio Magnoli citou fragmento de um parágrafo de conferência que proferi na Universidade Federal de Goiás em 2001. Mas ele suprimiu a frase seguinte às que citou -justamente o que daria sentido ao meu argumento, que, da forma como foi utilizado, pareceu absurdo.
Sua transcrição truncada fez desaparecer a crítica irônica que eu fazia ao tipo de ação afirmativa de uma faculdade do Estado de Maine, nos EUA. O tema da conferência era acusar a carência, naquele ano de 2001, de políticas de inclusão no ensino superior brasileiro, fossem de corte liberal ou socialista.
Magnoli ocultou dos leitores o que eu disse em seguida: "Quero contrastar isso com o que acontece no Brasil.
Como estamos nós? A Universidade de Brasília tem 1.400 professores e apenas 14 são negros". É 1% de professores negros na UnB.
E quantos são os docentes negros da USP? Dados recentes indicam que, de 5..434 docentes, os negros não passam de 40. Pelo censo de identificação que fiz em 2005, a porcentagem média de docentes negros no conjunto das seis mais poderosas universidades públicas brasileiras (USP, Unicamp, UFRJ, UFRGS, UFMG, UnB) é 0,6%.
Essa porcentagem pode ser considerada insignificante do ponto de vista estatístico e não deverá mudar muito, pois é crônica e menor que a flutuação probabilística da composição racial dos que entram e saem no interior do contingente de 18 mil docentes dessas instituições.
Para contrastar, a África do Sul, ainda nos dias do apartheid, já tinha mais professores universitários negros do que nós temos hoje.
Se não interviermos nos mecanismos de ingresso, nossas universidades mais importantes poderão atravessar todo o século 21 praticando um apartheid racial na docência praticamente irreversível.
É esta a questão central das cotas no ensino superior: a desigualdade racial existente na graduação, na pós-graduação, na docência e na pesquisa.
Pensar na docência descortina um horizonte para a luta atual pelas cotas na graduação.
Enquanto lutamos para mudar essa realidade, um grupo de acadêmicos e jornalistas brancos, concentrado no eixo Rio-São Paulo, reage contra esse movimento apontando para cenários catastróficos, como se, por causa das cotas, as universidades brasileiras pudessem ser palco de genocídios como o do nazismo e o de Ruanda!
Como não podem negar a necessidade de alguma política de inclusão racial, passam a repetir tediosamente aquilo que todos sabem e do que ninguém discorda: não existem raças no sentido biológico do termo.
E, contrariando inclusive todos os dados oficiais sobre a desigualdade racial produzidos pelo IBGE e pelo Ipea, começam a negar a própria existência de racismo no Brasil.
Fugindo do debate substantivo, os anticotas optam pela desinformação e pelo negacionismo: raça não existe, logo, não há negros no Brasil; se existem por causa das cotas, não há como identificá-los; logo, não pode haver cotas.
Raças não existem, mas os negros existem, sofrem racismo e a maioria deles está excluída do ensino superior. Felizmente, a consciência de que é preciso incluir, ainda que emergencialmente, só vem crescendo -por isso, a presente década pode ser descrita como a década das cotas no ensino superior no Brasil. Começando com três universidades em 2002, em 2009 já são 94 universidades com ações afirmativas, em 68 das quais com recorte étnico-racial.
Vivemos um rico e criativo processo histórico, resultado de grande mobilização nacional de negros, indígenas e brancos, gerando juntos intensos debates, dentro e fora de universidades. Os modelos aprovados são inúmeros, cada um deles tentando refletir realidades regionais e dinâmicas específicas de cada universidade.
Essa nova consciência acadêmica refletiu positivamente no CNPq, que acaba de reservar 600 bolsas de iniciação científica para cotistas. Se o século 20 no Brasil foi o século da desigualdade racial, surge uma nova consciência de que o século 21 será o século da igualdade étnica e racial no ensino superior e na pesquisa.

JOSÉ JORGE DE CARVALHO é professor da UnB (Universidade de Brasília) e coordenador do INCT - Instituto de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa do CNPq. É autor de "Inclusão Étnica e Racial no Brasil" (Attar Editorial).

segunda-feira, setembro 21, 2009

Quem é autoritário?

Os donos da mídia e seus aliados nas Américas já definiram que os atuais governos de nossos vizinhos Argentina, Bolívia, Equador e Venezuela são regimes “autoritários populistas” onde se tenta implantar “legislações autoritárias e anti-democráticas” (que tramitam regularmente nos respectivos Congressos).

Na tipologia dos sistemas políticos – diz o clássico “Dicionário de Política” organizado por Bobbio, Matteucci e Pasquino – o adjetivo autoritário refere-se aos “regimes que privilegiam a autoridade governamental e diminuem de forma mais ou menos radical o consenso, concentrando o poder político nas mãos de uma só pessoa ou de um só órgão e colocando em posição secundária as instituições representativas” (EdUnB, 1986, p. 95).

E prossegue: “Os regimes autoritários se caracterizam pela ausência de Parlamento e de eleições populares ou quando tais instituições existem pelo seu caráter meramente cerimonial e ainda pelo indiscutível predomínio do Executivo. (...) A oposição política é suprimida ou obstruída. O pluralismo partidário é proibido ou reduzido a um simulacro” (p. 100).

Pergunto ao leitor(a) se caberiam na definição de sistema político autoritário os atuais regimes da Argentina, da Bolívia, do Equador e da Venezuela onde os Parlamentos funcionam, a Oposição política está ativa, existe pluralismo partidário e realizam-se eleições democráticas periódicas, inclusive, com fiscalização de organismos multilaterais.

Independente de sua reposta, leitor(a), os donos da mídia e seus aliados nas Américas já definiram que os atuais governos de nossos vizinhos Argentina, Bolívia, Equador e Venezuela são regimes “autoritários populistas” onde se tenta implantar “legislações autoritárias e anti-democráticas” (mesmo que através de projetos de lei que tramitam regularmente nos respectivos Congressos Nacionais).

Autoritário, portanto, já há algum tempo, passou a ser o adjetivo utilizado uniformemente pela grande mídia, em toda a região, quando se refere aos governos democráticos de Argentina, Bolívia, Equador e Venezuela.

Venício Lima é Pesquisador Sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília - NEMP - UNB

quarta-feira, setembro 16, 2009

Confissões do Latinfúndio

Por: Pedro Casaldáliga
(Bispo jubilado de São Felix do Araguaia, MT)

Por onde passei,
plantei
a cerca farpada,
plantei a queimada.

Por onde passei,
plantei
a morte matada.

Por onde passei,
matei
a tribo calada,
a roça suada,
a terra esperada...

Por onde passei,
tendo tudo em lei,
eu plantei o nada.

Ministério do Desenvolvimento Arcaico

É um absurdo, sob qualquer aspecto que se analise, que o jornal Zero Hora, um veículo compromissado com o estamento mais arcaico, que mais concentra renda, menos distribui riqueza e menos gera ocupação de mão-de obra dentre todos os setores produtivos da economia, e que por isso criminaliza o MST, um dos pilares da agricultura familiar e sustentável brasileiras, receba verbas do Ministério do Desenvolvimento Agrário, a título de veiculação de peças de propaganda [ver acima], divulgando, exatamente, a agricultura familiar, e em celebração à feira que representa, justamente, o modelo produtivo que precisa ser superado a fim de se atingir um desenvolvimento justo, equilibrado e sustentável.

Nada pode ser mais antiagricultura familiar do que o modelo produtivo latifundiário da metade sul do RS, que anualmente celebra sua hegemonia em um encontro devotado [a Expointer 2009], exclusivamente, à circulação de capital dentro desse próprio modelo, retroalimentação que, para muitos, chega mesmo a ser condição de sobrevivência material, dado o grau geral de estagnação produtiva de um estamento que, atualmente, subsiste de ideologia.

Pescado do ótimo blog La Vieja Bruja.

sábado, setembro 12, 2009

Juiz chileno ordena prisão de 129 oficiais da era Pinochet

O juiz chileno Victor Montiglio ordenou a prisão de 120 ex-militares e oficiais da polícia secreta por acusações de abusos de direitos humanos cometidos durante o governo militar de Augusto Pinochet (1973-1990).

Todos os suspeitos pertenciam à temida polícia secreta, a Dina. Entre eles está o ex-chefe da Dina, Manuel Contreras, que já está cumprindo prisão perpétua por envolvimento com outros crimes cometidos durante o governo militar.

Vários dos 129 suspeitos listados pelo juiz ainda não haviam sido acusados previamente.

Segundo correspondentes na região, a ordem de prisão é a maior já emitida com relação aos abusos contra direitos humanos cometidos durante o governo militar no Chile. Acredita-se que mais de 3 mil pessoas foram mortas ou desapareceram neste período.

As prisões devem ocorrer a partir desta quarta-feira.

Em dezembro de 2005, o mesmo juiz Montiglio processou Augusto Pinochet, morto um ano depois, em 2006, sem nunca ter enfrentado um julgamento pelos crimes cometidos durante o seu regime.

'Operação Condor'

Os mandados expedidos por Montiglio são relacionados à chamada Operação Condor, a articulação secreta entre regimes militares de países da América do Sul, entre eles o Brasil e a Argentina, nos anos 70 e 80, que resultou na troca de presos políticos e de informações sobre atividades de opositores aos regimes.

A ordem diz respeito ainda a casos ligados à Operação Colombo, realizada pela polícia secreta chilena e que resultou no desaparecimento de 119 pessoas, em julho de 1975. A maioria dos desaparecidos era formada por dissidentes de esquerda que se opunham ao regime então recém-instaurado. Documentos indicam que a polícia secreta de Pinochet capturou e matou os 119.

Outro caso contemplado pelo juiz e seus mandados de prisão foi a detenção e desaparecimento de 10 membros do Partido Comunista chileno, em maio de 1976.

Fonte: Jusbrasil

Obs: o Brasil está muito atrasado nesse quesito, é o país em que os assassinos e torturadores da ditadura não sofrem nenhuma punição e ainda vivem adejando o poder , principalmente aqueles que davam as ordens. Nem os arquivos do período do regime são liberados, imaginem quando vamos chegar até as pessoas.

quinta-feira, setembro 10, 2009

Hugo Chávez, segundo Oliver Stone

“A Europa e o mundo precisam de dezenas de pessoas como ele, de líderes que fazem o que prometem”, disse o cineasta Oliver Stone sobre Hugo Chávez ao apresentar o filme “South of the Border” no Festival de Cinema de Veneza. Stone prevê dificuldades de distribuição nos EUA do filme que faz uma incursão pelos países latino-americanos governados pela esquerda, em especial pela Venezuela de Chávez. O mesmo já aconteceu com outros filmes dele que tratavam da realidade do povo da América Central e da América do Sul. Confira o trailer:

segunda-feira, setembro 07, 2009

Informar ou editorializar?

Por Emir Sader em seu blog, na Agência Carta Maior

Uma pena que a falta de prioridade ou a disposição de vetar aos brasileiros a possibilidade de assistir, diretamente, fazendo seus próprios juízos políticos, sem depender das versões que os órgãos da mídia dariam do importante evento, fez com que os brasileiros – em sua grande maioria – não pudessem assistir em direto os debates da reunião da Unasul, realizados em Bariloche na semana passada.

Talvez essa atitude dos canais de televisão deva-se a que as intervenções diretas e integrais dos mandatários latinoamericanos tenham sido, por si mesmas, denúncias das versões que grande parte da mídia insiste em passar aos leitores, ouvintes e telespectadores, com a forte dose de ideologização e de preconceito que carregam.

Em primeiro lugar, teriam se dado conta, a partir da intervenção de Hugo Chavez, que expôs um resumo detalhado de documento do governo norteamericano – atualizado este ano, já no governo Obama – da função bélica das bases militares dos EUA no mundo, incluindo a América do Sul. Havia menção explícita a uma das bases que a Colômbia menciona na lista de bases militares do convênio que têm com os EUA.

Os brasileiros teriam sabido, por exemplo, que Carmona, o efêmero presidente colocado no cargo pelo golpe militar venezuelano de 2002, rapidamente expulso pela reação popular de apoio a Hugo Chavez, está asilado na Colômbia, confirmando os vínculos entre a direita golpista daquele país com o presidente colombiano Uribe. Um detalhe significativo.

Teriam todos podido saber, pelas exposições, mapas e gráficos exibidos pelo presidente do Equador Rafael Correa, que a produção de coca na região tem na Colômbia seu inquestionável líder, com mais de metade, uma produção que segue em aumento, seguida do Peru e da Bolívia, tento a Venezuela e o Equador erradicado completamente sua produção. Os EUA seguem sendo, de longe, a principal destinação do tráfico.

Os mapas demonstram como a Colômbia não tem capacidade de controle das fronteiras com o Equador, dominada por grupos paramilitares e guerrilheiros. Revelam que, pela concentração da produção de cocaína e pela falta de controle de seu território, o problema da região é Colômbia, de que os outros países são vitimas.

Lula assinalou para Uribe, depois que este mencionou um sem número de convênios assinados pelo seu país, que se os acordos com os EUA – que incluem tropas norteamericanas, na Operação Colômbia – não resolveram o problema do tráfico de drogas, não vale a pena estender os acordos com esse país, convidando-o a integrar um plano dos governos da região para renovar os métodos de luta contra o narcotráfico.

Teriam podido ver que quem saiu melhor da reunião foi Lula, que tinha o objetivo de impedir que a Unasul fosse rompida, pelas evidentes contradições entre a grande maioria dos governos e o colombiano. Quem pôde assistir toda a reunião, se deu conta do imenso isolamento em que está a Colômbia, ao mesmo tempo que Uribe chegou à reunião com acordos já assinados com os EUA e afirmando que nada o faria voltar atrás. Os riscos de ruptura eram enormes portanto e o logro foi conseguir uma resolução comum de todos os governos.

À imprensa opositora só interessava saber se Lula saiu ainda mais fortalecido ou não. Errou ao dizer que não, mas também errou ao não se dar conta da importância da reunião e do isolamento do governo colombiano. Triste papel da imprensa que se faz, não instrumento de informação, mas de filtro pelo qual só passa o que lhe interessa, da maneira que lhe interessa. Pobres leitores, ouvintes e telespectadores, vítimas dessa imprensa mercantil e ideologizada, que confunde editorial com informação, editorializa tudo e se transforma em panfletos ideologizados no lugar de instrumentos para uma cidadania informada e capaz de construir democraticamente a opinião pública que o Brasil requer.

terça-feira, setembro 01, 2009

Senado em xeque

Por Tatiana Merlino

O Senado é necessário? Quais são as origens da crise da chamada Câmara Alta do legislativo? A Caros Amigos ouviu a opinião de oito personalidades para saber o que elas pensam sobre o tema que ganhou as páginas dos jornais nos últimos meses. Acompanhe, a partir de hoje, 01, a primeira entrevista do especial Senado em Xeque, com o dirigente nacional do MST, João Pedro Stedile. Na quinta-feira, 03, conheça a posição do ex ministro da Casa Civil, José Dirceu, Na sequência, Renato Rabelo, Valter Pomar, Waldemar Rossi, Marco Aurélio Garcia, Francisco de Oliveira, Wanderley Guilherme dos Santos.

Caros Amigos - Quais as origens da crise no Senado?

João Pedro Stedile - As origens da crise estão no sistema arcaico e nada democrático das eleições no Brasil. As oligarquias seguem controlando todo eleitorado, em especial os mais pobres. Eles têm o dinheiro repassado pelas empreiteiras e bancos (que depois vão pedir o troco). Eles controlam todos meios de comunicação. O Sarney é apenas a cara mais nua e antiga da classe dominante brasileira, e de como ela está acostumada a atuar na institucionalidade. No poder Judiciário é ainda pior. E no banco central, só Deus sabe como os bancos influenciam e manipulam a taxa de câmbio, de juros e da inflação.. Sua presença no Senado é uma aula didática, diária, de como no Brasil os ricos usam a coisa pública apenas em benefício de sua classe e de sua turma. Fica Sarney! Você é tão didático.

Caros Amigos - Por que o Sarney não serve mais para setores da direita que hoje fazem campanha por sua saída?

João Pedro Stedile - Primeiro, porque já passou dos limites. E segundo porque as elites tucanas paulistas querem inviabilizar a aliança esdrúxula entre o PT (Dilma) e o PMDB. O ataque teve mais contradições do que benefícios para a direita. Espero que o PT e o governo se dê conta de que não precisa se rebaixar tanto para eleger a Dilma.

Caros Amigos - Por que o PT e o próprio presidente Lula defenderam o Sarney?

João Pedro Stedile - Pela mesma lógica pragmática anterior. A prioridade número um é eleger Dilma, e eles fazem o cálculo de que precisam da aliança com PMDB. Mas cá entre nós, eles poderiam escolher uma ala melhor da federação peemedebista. E por conta disso, taparam o nariz, os olhos.. E em alguns Estados, a justificativa para apoiar candidatos a governador do PMDB é na mesma base, ou pior. Como exemplo, o que aconteceu no Maranhão. Apoiáram o golpe que o Sarney deu no Jackson Lago para depô-lo no tapetão e repor sua filhota, agora no PMDB, e em troca ganharam duas secretarias estaduais da Roseana. Francamente, diria Brizola.

Caros Amigos - O sistema de representação precisa ser alterado?

João Pedro Stedile - É preciso uma grande reforma política no Brasil para simplesmente termos uma democracia burguesa razoável. Como diria Raimundo Faoro, como fez falta uma revolução francesa, burguesa por aqui. Brincadeiras à parte, o INESC e a CNBB estão coordenando e coletando dezenas de propostas de entidades e movimentos sociais, e já apresentaram uma proposta do que seria uma reforma política necessária e urgente.

Caros Amigos - Há setores da sociedade que defendem a extinção do Senado, o que acha disso?

João Pedro Stedile- Me somo a esses setores. Poderíamos ter um regime político bem mais democrático, ampliando a representatividade popular da Câmara dos Deputados, elegendo de fato o número de deputados pelo número de eleitores, e não como agora, onde os votos da região norte valem 20 vezes mais do que um voto de São Paulo. E acabar com Senado. As questões relativas à federação, aos direitos federativos do Estado poderiam ser resolvidas no âmbito de um conselho da república, com peso igual por estado, convocado especificamente para esses temas quando necessário. No mínimo, os dois bilhões de reais que o Senado gasta de dinheiro público são uma afronta a uma sociedade tão desigual como a nossa.

Fonte: Caros amigos