segunda-feira, setembro 28, 2009

Pontos importantes foram retirados do Estatuto

Cotas raciais nas universidades e garantia de terra aos remanescentes quilombolas não são previstas no texto aprovado pela Câmara.

Michelle Amaral,

da Redação

Após quase de 10 anos de discussões em torno do Estatuto da Igualdade Racial, o texto aprovado pela Câmara dos Deputados deixou de contemplar alguns pontos previstos no texto original da proposta, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS).

Para ser aprovado, foram retirados do texto do Estatuto a garantia das cotas raciais nas universidades públicas, contestada pelo Partido Democratas (DEM), e a regularização de terras para remanescentes de quilombos, criticada pela bancada ruralista.

Questão fundiária

O argumento utilizado pelos parlamentares para a retirada do artigo que garantia a regularização das terras aos remanescentes de quilombos é a de que a questão já é prevista no decreto n.º 4.887 de 2003, que regulamenta o artigo 68 da Constituição Federal, que trata da demarcação de terras quilombolas.

Para Douglas Belchior, membro do conselho geral da União de Núcleos de Negros e Classe Trabalhadora (Uneafro), ao não reafirmar esse direito aos quilombolas no Estatuto, “o Estado brasileiro avança menos em relação à igualdade racial”. Ele afirma que a argumentação dos parlamentares é vazia, porque este é um direito descrito na Constituição, mas que ainda hoje não é uma realidade. "O Brasil teoricamente é um país democrático, de igualdade de direitos, mas essa igualdade não tem sido cumprida", completa.

“Toda vez que o debate da estrutura fundiária é colocado, há o levante dos setores reacionários”, observa Marcelo Paixão, diretor de graduação do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro do Movimento Negro do Rio.

Marcelo Paixão recorda uma declaração do deputado Indio da Costa (DEM-RJ), logo após a aprovação do Estatuto, de que se fosse prevista em seu texto a regularização das terras quilombolas haveria o risco de se formar “uma espécie de MST negro”. O professor defende que há um potencial de luta muito grande por parte das comunidades quilombolas, sendo que muitas já foram reconhecidas pela Fundação Palmares. Nesse sentido, Paixão diz querer muito “que as palavras do deputado se realizem, porque um MST negro aliado ao que já existe resultaria em muitas conquistas”.

Cotas nas universidades

Marcelo Paixão pondera que a obrigatoriedade da reserva de cotas raciais nas universidades públicas é uma questão polêmica, porque “a universidade brasileira é conservadora”. Ele acredita que a política de cotas é uma medida importante, mas que por si só não resolve este problema.

“Não acredito que a universidade brasileira mude positivamente se não mudar seu corpo discente e docente”, opina. Para Paixão, “se a política de cotas for adotada será um favor não só para a população, mas para a universidade, porque vai diversificar seu corpo discente e até docente, vai enriquecer a universidade”.

Desde 2008 tramita no Senado um Projeto de Lei Complementar que reserva 50% das vagas nas universidades para quem cursou o ensino médio integralmente em escola pública, sendo metade dessa cota para estudantes negros, pardos e indígenas e a outra metade para alunos oriundos de famílias com renda de até um salário mínimo e meio per capita. No entanto, o PLC 180 encontra dificuldades em ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) devido a posicionamentos contrários à adoção de políticas de cotas raciais.

Douglas Belchior analisa que neste contexto seria muito importante constar no Estatuto a garantia das cotas e a exclusão desse ponto “reafirma que a luta em torno das políticas de cotas deve continuar”.

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