segunda-feira, novembro 30, 2015

A extensão pode deixar a universidade com mais cara de Brasil.


O papel subalterno dado a extensão universitária, diante de seus colegas ensino e pesquisa, reflete a elitizada formação das universidades brasileiras. A função social da universidade pública é oferecer respostas a problemas sociais concretos do seu entorno, o braço da extensão é o que melhor serve a esse propósito.

No entanto, dentro do que é valorizado na carreira acadêmica hoje, os projetos de extensão são coadjuvantes, pouco valem em progressões profissionais, em concursos públicos, há pouco financiamento, há pouco reconhecimento e status social para quem se dedica a promoção da extensão.

Tendo a publicação em periódicos especializados como o critério nuclear de classificação da carreira docente, estamos valorizando em especial que perfil de profissional? Que tipo de atividade laboral cotidiana?

Estamos valorizando aqueles que ficam maior parte do seu tempo de trabalho sozinhos em frente ao seu computador, fazendo revisões bibliográficas, tabulando dados e, principalmente, adaptando seu trabalho as heterogenias normas das diversas revistas científicas. Estamos valorizando os que não querem mais dar aulas na graduação, os que não querem ocupar espaços de gestão ou burocráticos e usam seu tempo construindo estratégias, individuais ou em pequenos grupos, para publicar mais, pois esse é "caminho para o sucesso".

Os artigos não devem ser valorizados? Mas eles são fruto de pesquisa empírica também? Claro que devem ser valorizados, a questão é porque chegamos a um patamar taxionômico em que o reconhecimento advêm basicamente de uma fonte, a publicação em periódicos específicos?

O tráfico de influência, o conflito de interesses e a baixa politica, tristes características da vida política do país, também são percebidas no meio acadêmico. O lobby dos periódicos conformam um mercado lucrativo (status que por consequência traz dividendos, financiamento, contratos, patrocínios, etc...).

Projetos de extensão, vinculados a pesquisa, deveriam ser prioridade no serviço público, nos concursos e nos critérios de progressão na carreira.
Aqueles que se desafiam a propor melhorias reais para a vida das pessoas, que colocam a cara a tapa na sociedade civil, que visam popularizar o conhecimento e enfrentam interesses para qualificar políticas públicas deveriam ser extremamente valorizados, nem sempre o são. A meu ver esse seria um dever ético do meio acadêmico, da universidade.

Sei que há lindas experiências extensionista no Brasil e que muitas instituições avançaram muito, mas ainda é muito pouco. As Ações afirmativas dão esperanças nesse sentido, até 2022 esperamos que o novo público que chega à universidade possa oxigenar a academia e empoderar a extensão.

Enquanto pensarmos a pesquisa e a qualidade científica apenas pelo prisma da publicação (indexada ou não) estaremos reproduzindo relações de poder desiguais transplantadas da sociedade para o universo acadêmico. As áreas do conhecimento que têm maior proximidade com o capital (seja econômico ou de status) sempre deterão os espaços de prestígio, pois o sistema está e foi pensado com esse desiquilíbrio, desprezando critérios de equidade.

É preciso ter coragem política para romper com a dinâmica avaliativa aspecto técnico) e de reconhecimento (aspecto cultural/político), isso passa por pequenas mudanças normativas nas universidades e grandes mudanças, a nível nacional, nas políticas que tratam do ensino superior.

Gregório Grisa

quarta-feira, novembro 18, 2015

Rezar?

Campanha depois dos atentados de sexta-feira foi ‪#‎PrayForParis‬. Os terroristas dizem agir em nome do seu deus. Outra “hashtag“ é ‪#‎prayforsiria‬ , tudo girando em termos religiosos.

Preces, rezas, imensas bobagens ineficazes. 

Criar símbolos de comoção que se pautam em hábitos religiosos é uma doença, sinal de que a política, a técnica, a ciência, a diplomacia e a inteligência perderam.

Coletividades inteiras se mobilizam em torno de uma asneira monumental que é a ideia de deus, a imaturidade bestial com que vivemos nossa espiritualidade é uma das razões do nosso imobilismo e da nossa impotência.

Friedrich Nietzsche estava errado, deus não morreu, ele nunca existiu, crenças infantis como essa tem de perder força, sob pena de seguirmos como uma civilização andando em círculos, vendo se repetir guerras, violência, ignorância e injustiça.

sexta-feira, novembro 13, 2015

Pessoas merecem respeito, suas opiniões nem sempre.



Um discurso que sempre me inquietou foi o de que "todas opiniões devem ser respeitadas", respeito aqui entendido como aceitação de qualquer opinião, por mais estapafúrdia que ela seja. 

Esse discurso, que me incomoda, é muito forte quando o tema é a crença religiosa ou política das pessoas. Lendo um texto do controverso filósofo Slavoj Zizek encontrei a seguinte passagem:

"O respeito às crenças dos outros como o valor maior só pode significar uma de duas coisas: Ou tratamos o outro de forma condescendente, evitando magoá-lo para não arruinar suas ilusões, ou adotamos a posição relativista de vários “regimes da verdade”, desqualificando como imposição violenta qualquer posição clara em relação à verdade".

Eis o problema, não estou disposto a tratar o outro de forma condescendente e nem estou de acordo com o relativismo que aceita infindáveis "regimes de verdade". 

Então, em uma palestra recente que assisti do filósofo espanhol Fernando Savater ele me ajudou a sair desse labirinto, do seu ponto de vista não existe bobagem maior do que dizer que todas as opiniões são respeitáveis. 

“Todas as pessoas é que são respeitáveis, tenham as opiniões que tiverem. Mas as opiniões em si não são respeitáveis. Se uma pessoa acredita que dois mais dois são cinco, não deve ser presa ou torturada por isso. Mas a opinião de que dois mais dois são cinco não é mais respeitável que a opinião de que dois mais dois são quatro."

Temos de nos acostumar a distinguir que a forma de respeitar as opiniões é discuti-las. Do latim, 'discutere' era puxar uma árvore para ver se tinha raízes fortes ou não. Quando alguém discute uma opinião, quer ver se ela tem raiz na realidade, ou se é algo superficial.

A superstição que embasa os grandes preceitos do pensamento religioso e do criacionismo não é respeitável. A reprodução do senso-comum que sustenta as pautas reacionárias conduzidas pelo Congresso Nacional mais conservador da era moderna não é respeitável. 

A superficialidade política que alimenta o sentimento punitivo, o preconceito e a criminalização dos movimentos sociais e da população pobre não é respeitável.

Fazer a didática separação entre a pessoa e suas opiniões é muito importante para que o debate público se aprimore, para que a onda de burrice raivosa (como dizem Eliane Brum​ e Marcia Tiburi​) que vivemos seja combatida, para que não troquemos o debate essencial e necessário pelo contingente.