segunda-feira, março 30, 2009

Comentário sobre uma pesquisa importante.

Texto sobre “Estudo quanti-qualitativo da população afro-brasileira no município de Porto Alegre / RS, 2008”, feito pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFRGS

Estamos percebendo alguns movimentos por parte da academia no sentido de produzir pesquisar de fôlego sobre comunidades afro-brasileiras em vulnerabilidade social, essas pesquisas estão sendo realizadas com o intuito de contribuir para a elaboração de políticas públicas (institucionais) específicas que atendam a esse grupo social. Vemos de modo positivo esse movimento que vem fazendo a universidade, por mais críticos que sejamos em relação às ações de assistência feitas pelos governos, entendemos que essa parceria alimenta tais políticas, pois refina e qualifica o conhecimento detalhado sobre a identidade e o modo de vida das populações afro-brasileiras em vulnerabilidade social.

Sabemos que a maioria das populações brasileiras que passam por dificuldades de sobrevivência, que não recebem nenhum tipo de atendimento por parte do estado, que não acessam nenhum tipo de políticas sociais é composta por negros e pardos, e o Estudo quanti-qualitativo da população afro-brasileira no município de Porto Alegre / RS, 2008 feito pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFRGS vem se inserir nesse leque de pesquisas que com rigorosidade entram no espaço empírico desses grupos sociais não só para melhor entender os mecanismos de vida práticas dos mesmos, como também para dar voz para que as pessoas pesquisadas falem sobre seus valores, suas opiniões e seus anseios.

Independente dos vínculos da pesquisa com os setores governamentais (pesquisa feita para contribuir com subsídios para uma efetiva aproximação da Política Nacional de Assistência Social – PNAS - às especificidades da população afro-brasileiro-negra do município de Porto Alegre) é importante destacar a relevância dessa no sentido de percebê-la por outro prisma. Acreditamos que nenhum movimento de mudança contundente pode ser produzido na sociedade contemporânea sem levarmos em conta os aspectos étnico-raciais de um povo, isto é, a cultura – entendida aqui como um processo (prático e simbólico) histórico e dialético de relações sociais – de determinado grupo social deve ser interpretada para além das crenças e dos aspectos fenomênicos e essas pesquisas cumprem um importante papel nessa empreitada.

Temos claro que são os órgãos institucionais que têm hoje as ferramentas mais maduras para promover as mudanças imediatas que são necessárias na vida da população periférica em vulnerabilidade social, porém também sabemos que as políticas de assistência que existem em sua maioria são marcadas pelo paternalismo, pelo desconhecimento das reais demandas de determinado grupo social, por condutas universalistas em contextos múltiplos e polissêmicos. Daí nossa postura crítica e até certo ponto pessimista em relação a políticas governamentais descoladas de um estudo sério e específico sobre o grupo social que tal política vai atender. Quando falamos de estudo sério está implícita a idéia de que este tenha como objetivo fundamental analisar, interpretar, observar, mas basicamente ouvir dos sujeitos envolvidos quais são os principais problemas que a comunidade enfrenta e quais seriam suas sugestões por mais dotadas de senso-comum que elas sejam.

Esse passeio mais ousado que a universidade tem dado é algo muito positivo e que tem de ser ampliado e qualificado para além de relações com agencias de fomento e órgão governamentais, os movimentos sociais e as organizações populares e não governamentais comprometidas devem também ter a ciência, a pesquisa das universidades a seu serviço. O mundo acadêmico moderno se “iluminou” tanto que por vezes se segou quando voltava à realidade, isso quando voltava. A universidade deveria ter, assim como a terra, sua função social estabelecida na Constituição, mas mais que isso tínhamos que viver um tempo de relacionamento tácito entre os problemas sociais e os problemas de pesquisa. Pois, pensando bem, se é para termos um direito escrito na Constituição e inexistir na vida concreta como no caso da terra é melhor começarmos a construir na prática como faz a pesquisa já mencionada e como podemos fazer em nossos estudos, em nossas linhas de pesquisa, na configuração das relações sociais e profissionais que fizemos.

Na leitura da pesquisa supracitada podemos perceber que para imensa maioria - 96,8% - dos 500 entrevistados existe racismo no Brasil, as razões pelas quais as pessoas responderam essa pergunta de maneira positiva são múltiplas e o estudo se aprofunda nesse sentido. Pra nós o importante é ter claro que para os sujeitos sociais que sofrem de alguma forma a discriminação racial a existência do racismo é fato concreto e que faz parte da sua vida. Isso serve de apoio para afirmarmos que nosso país não é o berço da tão conclamada “democracia racial” e que esse mito deve ser rechaçado junto com todos os conceitos que o formam e o circundam.


Obs: Quem desejar ter acesso a pesquisa referida no texto é só me pedir que encaminho.

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