segunda-feira, agosto 16, 2010

Inocência

A água do canto das ruas estava quase na altura do cordão da calçada e em algumas partes passava disso, chovia fraco, mas constantemente naquele fim de tarde de sexta-feira. O frio parecia aumentar no galope do ponteiro que nos aponta os segundos no relógio, com pouca roupa, pois saira de manhã, Alfredo caminhava a passos largos para chegar na última aula do seu quinto semestre de letras. Havia uma convidada na sala, a professora estava recebendo Lindria, uma jovem escritora chilena. De voz fina, cabelos curtos e rasteiras que não salientavam a sua estatura alta para padrões femininos, Lindria viera falar sobre seu primeiro livro, um romance intitulado "Inocência".
O cansaço de Alfredo era visível, mas com o passar do tempo ele se interessou, não pela palestra nem pelo romance, que nas primeiras frases da autora já julgara mais uma auto ajuda, se interessou pela moça, pela pele, o espanhol cantado, o cabelo. Alfredo morava em uma pensão chamada "Palco" que tinha como costume receber estrangeiros, os donos desse singular lugar gostavam de fazer papel de guias turísticos com seus hóspedes. Já imaginaram o rumo da prosa não é? Lindria no final de sua explanação perguntou se alguém conhecia um lugar com as características do caracterizado acima, com o perdão da redundância. Alfredo, que era de titubear, dessa vez não o fez e tratou de indicar a "Palco" e se oferecer para acompanhá-la se fosse o caso. Pela falta de opções e pela indelicadeza da professora que não lhe ofertara um quarto a escritora aceitou a dica do cansado e molhado Alfredo. Ela tinha 32 anos e ele 25 recém feitos, jantaram um prato feito nada glamuroso, conversaram sobre as línguas, a literatura latina e se conheceram minimante. Alfredo percebeu um cacoete no nariz dela e Lindria se mantinha clássica a ponto de ser difícil de ler, até para o narrador, o que suas impressões cantavam. Chegaram na pensão, seu Lauro, o dono do lugar, estava quase pegando no sono quando Alfredo apresentou a moça de sotaque castelhano. Ela escolheu um quarto e se recolheu, ele contrariado fez o mesmo. Ao dar boa noite para o menino Lindria agradece e lhe diz que qualquer coisa estaria lendo no quarto 303, Alfredo gaguejou um pouco e lhe devolveu as gentilezas. Deitado de pijama ele começou a pensar se as últimas palavras da chilena poderiam representar algo, um convite talvez? Será que ela queria alguma continuidade na conversa? Apesar de cansado, o sono não passava nem perto da cama de Alfredo, ele pensou um tempo, engendrou outro bocado e se decidiu, tomou seu remédio para esses momentos e em menos de 5 minutos dormiu.

3 comentários:

Anônimo disse...

muito legal, manda para os jornais locais.
pai

jose grisa disse...

manda para o jornal local

rosane grisa disse...

Li procurando o autor. Tá muito bom. No fim, tem uma marca da oralidade "durmiu" em vez de dormir.Vale arquivar, publicar e prosseguir... Um beijo.