quinta-feira, novembro 11, 2010

Sobre o futuro governo Tarso Genro

Gregório Grisa – 11/10/2010

Tenho ouvido com certa preocupação que o futuro governo de Tarso Genro tem como objetivo importar algumas medidas, no que tange a educação, do governo eleitoralmente exitoso de Eduardo Campos de Pernambuco. Trata-se principalmente da implantação de um décimo quarto salário para professores ou medidas semelhantes orientadas pela meritocracia. Aqui cabe uma reflexão acerca do quadro atual da educação no Rio Grande do Sul e sobre os profissionais que dão vida a ela.

Exigir produtividade dos professores para alcançar metas e níveis cobrados por avaliações externas e quantitativamente massivas não seria uma medida saudável no nosso estado por uma razão muito simples, se estaria atacando os efeitos e não as causas dos problemas educacionais. Onde há uma profunda desigualdade de condições estruturais entre as escolas, entre as regiões do estado e entre os níveis de desenvolvimento político e pedagógico é injusto instaurar políticas meritocráticas. Isso é fato.

O que o poder executivo deve priorizar é uma inversão de prioridades, com o perdão da redundância, no que se refere a um conjunto de situações que quem vive o chão da escola experimenta. Vamos listar algumas.

1 – Hoje a política de contratação do magistério tem priorizado o contrato ao concurso, isso promove um conjunto de problemas, desde a insegurança e a falta de compromisso do trabalhador que vê seu emprego flexibilizado, até o fato dessa situação servir de mecanismo de controle político exercido por diretores e administradores públicos. O estado deve retomar uma política de concursos públicos e valorização da carreira do magistério.

2 – Em inúmeras bibliotecas de escolas estaduais não há bibliotecários, quem ocupa tal função são professores ou funcionários realocados para um serviço que não são especializados nem preparados, esse fenômeno é muito comum e prejudica não só a qualidade do trabalho nas bibliotecas como as relações profissionais dentro da escola, pois o redirecionamento de pessoal também é mecanismo punitivo ou de garantia de privilégio dependendo do caso. Essa realocação ocorre também no lecionar das disciplinas de filosofia e sociologia do ensino médio que em muitos casos são dadas por pedagogos, assistentes sociais e até professores de ensino religioso.

3 – Ouço relatos de amigos e tenho colegas que tiveram que se exonerar da carreira do estado para fazer um curso de mestrado ou de doutorado, nos eventos gratuitos que se organiza, por exemplo, na Faculdade de educação da UFRGS e que se convida os/as professores/as da rede estadual, a resposta frequente recebida é a de que não há liberação por parte da escola e da coordenadoria, embora os/as docentes desejem participar. Essa lógica da “não liberação para congressos e seminários” tem de mudar, assim como esse olhar atrasado que não valoriza a formação em nível de pós-graduação para o magistério. Aqui cabe o diálogo para uma mudança mais radical, rever o plano de carreira estadual que prevê mudança de categoria somente até a titulação de especialização, os professores que fizerem mestrado e doutorado também devem ascender na carreira e isso deve ser incluído nos planos.

4 – Renovar as características da avaliação da educação, fazer um projeto regionalizado de avaliação para conseguir atacar os problemas locais de modo detalhado, não seguir os modelos homogeneizadores de avalição que quantificam o todo e não vislumbram alternativas para problemas pontuais. Isso não quer dizer que deve-se deixar de lado os princípios nacionais e estaduais de avaliação e que não se possa elaborar políticas gerais que atinjam toda rede. Essa avaliação regionalizada ou descentralizada deve ir além do ensino, acredito que esse é elemento condicionado por vários aspectos. As estruturas físicas das escolas (várias em péssimo estado), as condições de trabalho dos professores e funcionários, o formato curricular e metodologias das instituições e as reais condições da gestão democrática dos recursos das escolas são pontos que devem ser centrais na avaliação.

Esses são alguns tópicos para pensar medidas possíveis e acertadas que o próximo governo pode tomar, acredito que o trabalho deve ser constantemente dialogado com o Cpers e demais entidades representativas. Há que se deixar de lado políticas eleitoreiras baseadas na meritocracia que buscam responder a anseios midiáticos de rankeamento do ensino e retomar o fortalecimento de uma política de estado que valorize a carreira e o concurso público, que em colaboração com a união atinja o piso salarial do magistério o quanto antes, que priorize a formação docente em todos os níveis e que através de projetos transversais faça investimentos altos com o objetivo de atacar as causas e não os efeitos dos problemas educacionais.

Sem uma base salarial justa, sem uma estrutura física de qualidade nas escolas, sem o aperfeiçoamento da gestão democrática em todos os níveis desde a unidade escolar, passando pelos conselhos municipais e estadual de educação até a secretaria estadual, sem a construção de uma política de formação continuada que se consolide como política de estado, e não circunstancial, vai seguir se medindo índices de aprendizagem e buscando estratagemas mil para interpretá-los e pouco vai se avançar.


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