sexta-feira, outubro 03, 2014

O engodo do "voto na pessoa"



Ouço muita gente dizendo com orgulho "não voto em partido, voto na pessoa".

Desanimo, pra mim é como escutar, "os negros é que são racistas", "feminismo é exagero". 

Comparação esdrúxula a minha? É que se trata do mesmo sintoma, não compreensão de elementos estruturais da realidade e foco de modo míope no singular. 

Ingenuamente, muitos acham que um parlamentar ou gestor sozinho, por ser "de bom coração" ou sincero, irá colocar em prática suas bem intencionadas propostas. 

Isso não existe, os partidos tem estatutos, tem caciques, tem tendências ideológicas gerais, tem alianças e isso está acima da ação do indivíduo.

Um voto seu em alguém "legal" de um partido qualquer que não representa teu pensamento, vai eleger, talvez, o cara legal, mas com certeza vai eleger outros do partido dele, a eleição proporcional é assim. 

Votar em alguém cujo partido você não sabe se é de direita ou de esquerda, não sabe o que a sigla pensa sobre a questão econômica, a questão dos costumes, do papel do Estado, é o mesmo que votar no escuro, aleatoriamente. 

O voto "na pessoa" é fruto da despolitização que os formatos eleitorais da nossa democracia representativa tem produzido. 

O prudente e coerente é o contrário, votar em projetos, em partidos, em tendências ideológicas,  e dentro desse leque, em um candidato que represente suas escolhas. 

Me entristece ver as pessoas dizendo que políticos são todos iguais, que política é sinônimo de sujeira, mas me indigna ainda mais o orgulho com que muitos dizem isso, achando ser descolados, espertos e infalíveis. 

O pior analfabeto é o analfabeto político disse Bertolt Brecht, que atualidade.

"Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais."

Gregório Grisa

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